Hólar

fotografia. filipe sousa | 23 novembro 2022

 

















«Desde o dia do seu nascimento até morrer, o poeta norueguês Olav H. Hauge viveu numa quinta em Ulvik, na região dos fiordes de Hardanger. A quinta situa-se na parte mais profunda do fiorde e está ladeada por montanhas de cortar a respiração. Cada caminhada que fizermos pelo terreno íngreme à roda de Ulvik começa por um longo trilho que sobe pela montanha. As estantes de Hauge estavam repletas de literatura de todo o mundo, e o poeta frequentemente caminhava sozinho pelas redondezas, enquanto a sua mente discorria sobre livros que lera e sobre os seus autores, sem deixar de observar como o mundo mudava, como se lê no seu poema «O teu caminho» («Din veg»):

«Este é o teu caminho.
Só tu vais percorrê-lo,
E não se pode voltar para trás.»

É verdade! Há um só caminho. É o nosso, que criamos à medida que caminhamos, mesmo quando caminhamos pelos mesmos trilhos. Porém, não acredito que não se possa voltar para trás. Podemos sempre inverter o caminho a qualquer instante do dia. O caminho de regresso, no entanto, será diferente.
O poeta espanhol Antonio Machado dizia uma coisa semelhante quando caminhava pela paisagem de planícies batidas pelo vento, entre os carvalhos e colinas à roda de Castela «onde as rochas parecem sonhar». No seu poema «Caminante no hay camino», escreveu quase as mesmas linhas que Hauge:

«O caminho faz-se caminhando,
E quando olhas para trás
Vês o trilho que os teus pés
Nunca mais hão de percorrer.»

Depois de ler Machado, Hauge escreveu o seguinte no seu diário: «Até que enfim alguém concorda comigo!»

Erling Kage, A Arte de Caminhar. Um Passo de Cada Vez (Å Gå. Ett Skitt av Gangen, 2018), Quetzal Editores, Lisboa, 2022, pp. 100-101.