Serra do Álamo

fotografia: filipe sousa | 30 janeiro 2022

 
















«Gramáticas de pedra: a imensidão de gestos empilhados, argamassados, inteiros, derrocados, precários, resistentes, soltos, protectores, desolados, ruidosos - traços que como rios serpenteiam na paisagem seca da história imprimindo aos lugares o silêncio habitado que a ausência humana sempre deixa.

(...)

Muros são gigantes solitários presos às origens da sedentária gesta humana. Não apenas dos grandes feitos, mas de todas as realizações, aspirações desejos e sonhos íntimos, perdidos, esquecidos - passados e presentes - de homens laboriosos que assim buscam na apropriação do espaço a perpetuação da sua própria eternidade transformada em escrita da paisagem.»

Gabriella Casella, Gramáticas de Pedra - Levantamento de tipologias de construção murária, CRAT - Centro Regional de Artes Tradicionais, 2003. 

Berlin / Berlim, Mühlenstrasse (East Side Gallery)

fotografia: filipe sousa | 25 janeiro 2020

 















Nikolai Gógol (1809-1852) é considerado o grande prosador da literatura russa moderna. Com o seu Poema (Almas Mortas, na tradução portuguesa) imaginou "o livro" sobre a Rússia, uma obra épica que não apenas retratasse a Rússia feudal do seu tempo como lhe traçasse o futuro.
Curiosidade: Gógol nasceu na província de Poltava, que hoje pertence à Ucrânia, mas que na época fazia parte do Império Russo czarista.
Como consequência, tanto a Rússia quanto a Ucrânia reivindicam agora a sua nacionalidade.
O que Gógol não imaginou é que a disputa sobre as suas origens se tornaria num dos rastilhos da actual tensão entre os dois blocos políticos e militares.

«Também tu, ó Rússia, não correrás assim, como uma troika célere e inultrapassável? Fumega o caminho debaixo das tuas rodas e tudo vai ficando para trás. Queda-se o espectador, espantado com o milagre divino: não será isto um raio do céu? O que significa esta correria de meter medo? Que força obscura existe nestes cavalos que o mundo desconhece? Eh, cavalos, cavalos, que cavalinhos! Será que as vossas crinas transportam furacões? Tereis em cada veia um ouvido apurado? Ouvistes de cima uma cantiga familiar e logo retesastes, todos de uma vez, os vossos peitos de cobre e, quase sem tocardes com os cascos em terra, tornastes-vos linhas estiradas voando pelo ar, e toda ela corre, inspirada por Deus... Rússia! Para onde corres tu? Responde-me. Não há resposta. Desfazem-se os guizos num divino guizalhar; troveja e faz-se vento o ar rasgado em pedaços; a teu lado voa tudo o que há na terra e, olhando de soslaio, afastam-se e abrem-lhe alas os outros povos e Estados.»

Nikolai Gógol, Almas Mortas - poema, (Mertvi Duchi (Poema), 1842), trad. Nina Guerra e Filipe Guerra, Assírio & Alvim, Lisboa, 2002, p.327.