Ait Merzoug

fotografia: filipe sousa | janeiro 1994

Com um dia de atraso sobre o inicialmente previsto, alcançámos a aldeia de Ait Merzoug, encravada no sopé da vertente sul do Masker. Precisamente no momento em que o sol, roçando a orla da montanha em frente, dardejava a sua réstia de luz nas paredes ocres das habitações, avivando-lhes o magnetismo. Sem novidade, fomos acolhidos calorosamente em casa do moqqadem. Chamava-se Akbar e, nas horas vagas, carpintejava móveis em cedro, verdadeiras obras-primas de arte, engenho e, sobretudo, muita paciência. Esta ocupação garantia-lhe um complemento importante aos magros réditos retirados da pastorícia. No entanto, felizes dos que, como o irmão, haviam insuflado o peito de ambição e tentado a sua sorte em França. Era dele o retrato na parede, lado a lado com o de Hassan II. O chá protocolar acabou por desviar a conversa para o ensejo de fotografar a sua mulher, que acabava de entrar no aposento com o samovar fumegante. Para nossa satisfação, foi-nos permitido fazê-lo no recolhimento da sala de tecelagem. Um rosto serenamente absorto, ao mesmo tempo tímido e encantador, um tudo-nada desfocado por detrás das linhas verticais do tear, eis o que os nossos olhos retiveram.

Filipe Sousa, Alto Atlas Oriental: no coração de Marrocos (diário de viagem), 1993. 

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