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fotografia: filipe sousa | 17 junho 2023 |
Dia 5 - Ilha de Corfu (Gastouri, Gardiki, Paleocastrizzia)
Chego a Gastouri com a expectativa não tanto de visitar o pesado Achilleon, o palácio de Sissi, menos conhecida por Elisabeth, imperatriz da Áustria, mas o seu magnífico jardim suspenso sobre a costa, a escassos dez quilómetros a sul da cidade de Corfu. Acabo por bater com o nariz no portão. Encerrado durante os próximos dois anos por motivo de obras de conservação, informa-me um guarda.
A decepção dura até encontrar bem perto as primeiras oliveiras monumentais, responsáveis por boa parte do coberto vegetal da ilha e cujo plantio foi incentivado pelos venezianos a partir do final do século XIV. Este interesse explica-se porque os camponeses corfiotas recebiam uma recompensa de dez moedas de ouro por cada olival de cem oliveiras plantadas. Ao mesmo tempo, pagavam os impostos em azeite. A maioria das árvores é desse tempo, atingindo dimensões invulgares devido a nunca terem sido podadas! De entre os que foram tocados pela sua beleza, conta-se Edward Lear (1812-1888), que visitou a ilha em duas ocasiões, 1848 e 1855, e nos deixou magníficas gravuras destas oliveiras centenárias, de troncos amplos e retorcidos.
Vou confirmando, nos vários olivais que visito, que as azeitonas são varejadas de forma tradicional ou então, nos olivais instalados em declives, caem naturalmente sobre redes, sem tocarem no chão, que as encaminham para lugares de recolha em zonas mais baixas. Em Paleocastrizzia, encontrei um olival assim, tão próximo da costa que havia restos de azeitonas na praia e até no fundo do mar!
Aqui não há vestígios de tratamentos químicos e as árvores são intocáveis, o que faz com que passear nestes olivais seja um prazer e o azeite obtido de uma grande pureza. Em vez de olivais intensivos e superintensivos, encontramos florestas cerradas em que as oliveiras são respeitadas como divindades. Pura poesia! Chego assim a Lawrence Durrell e Eugénio de Andrade, e à homenagem de ambos às oliveiras de Corfu. SOBRE O DESEJO
Hei-de levar este esplendor para um poema, dizia eu, sempre que me estendia à sombra branca e miúda de uma oliveira. Mas fosse onde fosse, em terras de Corfu ou de Maiorca, nos campos de Siena ou no chão da minha infância, sempre adormeci sobre o desejo.
Hoje, que a violência do estio me levou a escarvar a própria pedra, queria apenas uma dessas árvores de bruma, por mais exígua, e adormecer à sua sombra.
Eugénio de Andrade, «Memória Doutro Rio» (1976-1977), in Poesia e Prosa (1940-1980), 2ª ed., Limiar, Porto, s.d., pp. 252-253.
OLIVES
The grave one is patron of a special sea,
Their symbol, food and common tool is one,
Yet chthonic as ever the ancients realized,
Nothing your tips in trimmings kindled quick,
Your mauled roots roared with confused ardours,
Holding in heat, like great sorrows contained
By silence; dead branch or alive grew pelt
Refused the rain and haboured the ample oil
For lamps to light the human eye.
So the poets confused your attributes,
Said you were the Other but also the domestic useful,
And as the afflatus thrives on special discontents,
Little remedial trespasses of the heart, say,
Which grows it up: poor heart, starved pet of the mind:
They supposed your serenety compassed the humann span,
Momentous, deathless, a freedom for the chain,
And every one wished they were like you,
Who live or dead brought solace,
The gold spunk of your berries making children fat.
Nothing in you being lame of fraudulent
You discountenanced all who saw you.
No need to add how turning downwind
You pierce again today the glands of memory,
Or how in summer calms you still stand still
In etchings of a tree-defining place.
Lawrence Durrell, Poems, Faber and faber Limited, London, 2006, p. 47.