Trujillo, Plaza Mayor

«São três horas da tarde quando entro em Trujillo, e tenho sorte, porque tem apenas quinze mil habitantes e estão todos a dormir. Através de ruelas silenciosas conduzo para a Plaza Mayor, onde o único sobrevivente põe, a troco de dez pesetas, um talão de estacionamento por baixo do limpa-pára-brisas e se retira para a sombra, nas escadas ao lado da igreja de San Martín. A única coisa que ainda se mexe agora são as cegonhas, dentro e em cima das torres, pateiam um pouco para cá e para lá nos seus ninhos desordenados, despreocupadamente, no seu próprio calor africano. Mesmo à minha frente encontra-se uma colérica estátua equestre do conquistador Pizarro, a espada em riste pronta para espetar alguns incas, e é o que terá de continuar a fazer até ele próprio ser assassinado, pois o escultor esqueceu-se de lhe dar uma bainha para guardar a arma. O relógio solta uns sons roucos, portanto sem dúvida que aconteceu algo com o tempo, mas na praça nada muda.»

Cees Nooteboom, O (Des)Caminho para Santiago, (De Omweg Naar Santiago, 1992), trad. Patrícia Couto e Arie Pos, Asa Editores, Porto, 2003, p. 144. 


fotografia: filipe sousa | 14 abril 2019

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