Verdade é que na beira me encontrava
do vale desse abismo doloroso,
que de infinitos gritos ressoava.
Escuro e profundo era e nebuloso,
tanto que, por volver o rosto ao fundo,
lá nada distinguir era forçoso.
«Ora desçamos pois ao cego mundo»,
começou o poeta e empalidece:
«irei primeiro e tu irás segundo.»
E eu, como a palidez apercebesse,
disse: «Como, se temo desalentes,
que és quem conforto ao medo me oferece?»
E ele a mim: «A angústia destas gentes,
que estão aqui, o rosto já me tinge
do apiedar que tu por temor sentes.
Vamos, que a longa via a tal constringe.»
Assim entrou e assim me fez entrar
no círculo exterior que o abismo cinge.
(...)
Dante Alighieri, A Divina Comédia (La Divina Commedia, sec. XIV), Parte I - Inferno, Canto IV, vs.7-24, trad. Vasco Graça Moura, 6ª ed, Bertrand Editora, Chiado, 2002, p. 55.
fotografia: filipe sousa | 26 julho 2016 |
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