Sobral da Adiça, Rua da Liberdade 31

Passam agora cinquenta anos sobre a aparição desta obra de referência da arquitectura de terra e trinta sobre a morte do seu autor. 

«(...) o camponês construiu a sua casa com terra, ou com tijolos de terra, que tirou do solo e deixou secar ao  sol. E ali, em cada casebre, em cada casa em ruínas, encontrava-se a resposta ao meu problema. Ali, durante anos, durante séculos, o camponês tinha sábia e tranquilamente explorado este óbvio material de construção, enquanto a nós, com as nossas ideias modernas aprendidas nas escolas, nunca nos tinha passado pela cabeça que fosse possível utilizar um material tão insignificante como a terra numa criação tão séria como uma casa. Mas por que não? Na verdade, as casas dos camponeses eram pequenas, escuras, sujas e pouco confortáveis, mas não por culpa do tijolo de terra. Naquelas casas não havia nada que não pudesse ser resolvido com um bom projecto e uma varridela. Por que não utilizar este material caído do céu nas nossa casas de campo? E, realmente, por que não melhorar as casas dos próprios camponeses? Por que razão haveria de existir diferença entre a casa do camponês e a casa do proprietário? Construam ambas em tijolos de terra, façam bons projectos para ambas, e ambas poderão oferecer aos seus proprietários beleza e conforto. (...)


fotografia: filipe sousa | 19 setembro 2011

Se uma aldeia tiver de ser construída pelos seus futuros habitantes, é preciso dar-lhes as competências necessárias. Seja qual for o entusiasmo que o sistema cooperativo possa suscitar, não servirá de grande coisa se as pessoas não souberem assentar tijolos. O número de trabalhadores relativamente qualificados necessário à construção de uma aldeia é demasiado elevado para se colocar a hipótese de recorrer à ajuda exterior, pois isso faria subir muito o preço. (...)
Já expliquei que um sistema cooperativo de construção só pode funcionar se o trabalho de cada homem puder ficar registado como um empréstimo à sociedade a ser devolvido sob a forma de construção. Obviamente, o trabalho de um pedreiro qualificado terá mais valor do que o de um trabalhador não especializado. Caso a comunidade permita que os seus pedreiros empreguem o seu tempo precioso a instruir aprendizes, será necessário que alguém pague por este tempo. Por isso, o plano de formação artesanal deverá prever que os aprendizes paguem a sua formação fornecendo à comunidade, a um preço abaixo do normal, as suas competências recém-adquiridas.»

Hassan Fathy, Arquitectura para os Pobres - uma experiência no Egipto rural (Arquitecture for the Poor, an experiment in rural Egypt, 1969), trad. Joana Pedroso Correia, Argumentum/Dinalivro, Lisboa, 2009, pp.15,130-131.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.